22 de ago. de 2010

A lente de Spinoza: uma ótica para uma ética


Queria escrever a respeito de um pensador que li, para fazer um seminário, essa semana. Baruch de Spinoza (1632-1677), pensador judeu excomungado pela sua sinagoga, nascido em Amsterdã e que viveu à margem da sociedade e época, do qual foi filho. Escolheu trabalhar como produtor de lentes, a fim de entender os princípios da ótica e criar novas for

mas de ver o mundo. Além disso, foi um grande filósofo e sua obra mais refinada foi a Ética, pois tratou de temas importantes a época, de forma controversa. Por exemplo, a ideia de que Deus e todas as outras criaturas derivam da mesma substância. Logo, Deus e o homem são frutos de um mesmo plano, o Plano de Imanência.

Além de tratar de filosofia, Spinoza tratou de política. Em seu Tratado Político, obra inacabada, ele nos deixou uma visão de como o governo deveria funcionar e qual seria a melhor forma de governo entre os homens. A Democracia, é impreterivelmente, a escolhida por ele, haja visto que comporta a maior variedade de pessoas. Em uma sociedade democrática, as pessoas se unem para aumentar sua potência positiva, e desenvolver sua capacidade enquanto indivíduos. Para entender melhor essa ideia, sugiro o seguinte exemplo: se em uma sociedade não há leis, no estado de natureza, um indivíduo por ser mais forte pode exercer uma potência negativa para com o outro, pois o constrange. Se, a existência do estado de natureza é para que os indivíduos desenvolvam suas capacidades, logo a sociedade se organiza para que as potências possam se unir, e não se constranger. Para Spinoza, a Sociedade consiste num tipo de

Estado no qual um conjunto de homens compõe sua respectiva potência de maneira a formar um todo de potência superior. Este estado conjura a fragilidade e a impotência do estado de natureza em que cada um corre sempre o risco de encontrar uma força superior à sua capaz de destruí-lo. O estado civil ou de sociedade assemelha-se ao estado de razão, e contudo apenas dele se assemelha, o prepara ou lhe ocupa o lugar [...]. Isto porque, no estado de razão, a composição dos homens faz-se segundo uma combinação de relações intrínsecas, determinadas pelas noções comuns e pelos sentimentos ativos que delas decorrem [...]. (DELEUZE, 2002, p. 112)

Depois de ler Spinoza, e começar a ler Simmel (sociólogo alemão) e andar pelas ruas, ver a vida e conversar com as pessoas que compõe meu mundo, fiquei pensando muito, por isso escrevi esse texto. Longe de ter qualquer atitude racional, me sinto incomodado com as coisas que me aconteceram por esses dias.

Ontem fui a um espetáculo de dança, “A wonderfull geekiness”, algo como (uma maravilhosa cafonisse, traduzindo para o português). Dança contemporânea, baseada em músicas da década de 1960 e 1970. Longe de ser um momento de calma, essas duas décadas condensaram a inocência e a turbulência, de um período marcado por diversos conflitos políticos.

Após acabar o espetáculo, sentei num local agradável e comecei a conversar com a pessoa que me acompanhava. Tive, ligeiramente, a sensação de que estava entre os momentos de “Antes de amanhecer” e “Antes do pôr-do-sol” – porém, foi uma ligeira sensaçã. Para quem não conhece, são dois filmes que dizem respeito à vida de duas pessoas: Jesse e Celine. (O resto eu não fala, recomendo que vejam, vale a pena!!). Então, certo: qual a relação entre Spinoza, dança contemporânea, filmes e conversas e ainda Simmel? É simples: a união de tudo aquilo que nos é combinável, o aumento de potências.

No mundo onde há a perda de áurea o tempo inteiro, composto de relações líquidas, eu não me sinto pertencente a isso. E, esse texto, deriva justamente das inquietações da forma como tenho visto meu mundo.

Ao meu ver, a individualidade é um caminho primordial para a liberdade. Nunca seremos completamente livres, na medida em que vivemos num mundo em que somos constrangidos todas as horas. Seja por uma lei, ou por outra pessoa. É justamente por isso, que devemos combinar as potências, de modo que as forças se unam, e não ao contrário. Indivíduos que se unem para aumentar a conattus, e dizer sim a vida! Não é questão de esperar pela Revolução, é questão de fazer o nosso próprio levante a tudo o que nos cerca. Se o mundo perdeu o encanto e áurea, então qual é o sentido disso tudo? Nós que damos sentido.

Ao invés de nos sedentarizar, como fizeram nossos antepassados, deveríamos seguir o pensamento nômade. O que é ser nômade? Ser tudo o que podemos ser, viver a vida como melhor nos convém. Sermos excêntricos, ao invés de centrados. Se, ao criar o plano de Imanência, que nos traz para o interior da vida Spinoza produziu sua melhor lente, quando vivemos um pouco de cabeça para baixo, acho que podemos ter novas experiências. E mesmo que sejam sutis, provavelmente darão significados felizes para nossa vida.

2 comentários:

Ayrus Ar disse...

Tudo é uma maravilhosa dança de esquisitice! E curioso como, por momentos, a vida arrítmica se compassa!
E as correlações e sensação de totalidade surgem!

Para contribuir com mais um elemento de sincronicidade: A mensagem que recebi hj:

"A vida de todo ser humano é um caminho em
direção a si mesmo, a tentativa de um caminho, o seguir de um simples
rastro. Homem algum chegou a ser completamente ele mesmo. Mas todos
aspiram a sê-lo, obscuramente alguns, outros mais claramente, cada qual
como pode. [...] Há os que não chegam jamais a ser homens, [...].
Outros que são homens da cintura para cima e peixes da cintura para
baixo. Mas cada um deles é um impulso em direção ao ser." (HERMANN
HESSE)

Anônimo disse...

Eu acho que Espinosa é bem daqueles contratualistas que acreditam que existiu mesmo o estado de natureza.Para ele,o estado de natureza não é uma construção que serve de modelo para explicar a formação do estdo civil.